A decisão do governo federal de transferir simbolicamente a capital do Brasil de Brasília para Belém, entre os dias 11 e 21 de novembro, durante a 30ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP30), carrega uma intenção clara: destacar a Amazônia no centro da agenda ambiental global. Mas o gesto, embora carregado de simbolismo, esbarra em contradições práticas que fragilizam o discurso do país no cenário internacional.
Desde sua fundação, Brasília representa o centro político-administrativo do Brasil. A escolha de deslocar temporariamente essa estrutura para Belém pode soar como um reconhecimento da importância estratégica da região amazônica, mas corre o risco de se tornar apenas um ato performático — sobretudo diante dos recentes retrocessos ambientais em curso no país.
Enquanto se promove o protagonismo amazônico no discurso, o Congresso Nacional avança sobre o Código Florestal, flexibilizando regras e abrindo brechas para o desmatamento legalizado. Ao mesmo tempo, o governo federal autorizou novas licenças para exploração de petróleo a cerca de 500 km da foz do Rio Amazonas, em uma região ecologicamente sensível, contrariando alertas técnicos e mobilizações da sociedade civil.
Essas decisões expõem um abismo entre o que se fala e o que se faz. A Amazônia segue pressionada por desmatamento, grilagem, queimadas e conflitos fundiários, enquanto comunidades tradicionais convivem com a ausência crônica do Estado. Não é a presença temporária dos Três Poderes em Belém que mudará essa realidade.
O protagonismo da floresta não se impõe por decreto. Ele precisa ser construído com base em políticas públicas duradouras, fortalecimento da fiscalização, incentivo à bioeconomia e valorização dos povos que vivem na região. A simbologia da capital temporária só terá real valor se vier acompanhada de coerência e compromisso efetivo com a preservação ambiental.
Belém pode até ser o centro do poder por dez dias, mas sem ações concretas, a transferência da capital será apenas um gesto vazio — uma encenação diante dos olhos do mundo.

